segunda-feira, 9 de junho de 2008

'FAÇA O QUE EU MANDO, MAS NÃO FAÇA O QUE EU FAÇO'

'FAÇA O QUE EU MANDO, MAS NÃO FAÇA O QUE EU FAÇO'

São Paulo, 12 de maio de 2008.

Isaias Guimarães

Aposentado Varig

Certamente, esta é a máxima predileta do Governo Federal! Enquanto pede aos brasileiros para cumprir a lei, a cooperar, pagar correta e honestamente os impostos, deixa de cumprir uma simples sentença judicial, favorável a um não tão pequeno grupo de brasileiros, lesados por sua incompetência, e má fé de alguns de seus colaboradores.

O assunto não é tão simples assim! A princípio seria apenas mais um desmando do governo, que em conseqüência, deixou à míngua nove mil chefes de família, aposentados da ex-maior empresa aérea brasileira, que durante 80 anos prestou serviços diferenciados de transporte aéreo aos seus milhares de usuários, ao redor do mundo.

O fato de nove mil famílias, cujos chefes, funcionários da Varig,quando ativos, haverem contribuído com boa parte de seus salários para obterem uma digna complementação de aposentadoria, missão que deveria ser cumprida de forma vitalícia, segundo a lei, e durou somente até o ano de 2006, não é o ponto mais importante, embora seja muito triste e desanimador.

Na verdade, o ponto mais importante, seria o descrédito da população com relação ao sistema nacional de previdência privada complementar.

O exemplo dado pelo governo com relação a conivência do órgão fiscalizador (SPC), com atitudes ímprobas da patrocinadora, Varig, traz a certeza de que nenhum investidor do sistema de previdência complementar no Brasil, seja de natureza aberta ou fechada, pode estar seguro de receber os benefícios prometidos.

Vejamos, em continuação, o que aconteceu com os contribuintes, hoje aposentados, da virtualmente desaparecida Varig.

Já em 2001, se prenunciava o desastre. A Varig, em estado pré-falimentar, deixara de recolher ao Instituto Aerus, não só sua parte, porém também deixara de repassar os valores descontados em folha, de seus funcionários. Passaram-se cinco longos anos, sem nenhuma providência do órgão que fora criado especialmente para fiscalizar os planos de previdência complementar fechados. Pior que tudo, a Secretaria de Previdência Complementar, endossou 21 contratos ilegais, emitidos pela Varig, para 'garantir' simbolicamente sua dívida que girava em torno de R$ 3.0 bilhões (em números atuais).

No ano de 2004, foi movida uma ação civil pública, denunciando os crimes, e requerendo a cobertura devida por parte do governo, já que se tratava o Instituto Aerus, administrador dos planos Varig de aposentadoria, de uma entidade regularmente reconhecida, e cuja fiscalização estava a cargo da Secretaria de Previdência Complementar, órgão vinculado ao Ministério da Previdência.

O Desastre anunciado aconteceu em abril de 2006. A Secretaria de Previdência Complementar, que negligenciava há muito tempo suas atribuições, não fiscalizando, 'descobriu' que devido a dívida da Varig, o Instituto Aerus não possuía fundos suficientes para honrar o pagamento das pensões dos aposentados.

Diante disso, mesmo sendo totalmente culpada pelo ocorrido, já que fora conivente com a desonestidade da administração da Varig, a Secretaria de Previdência Complementar (SPC), decretou a liquidação dos planos de benefício Varig, por falta de recursos suficientes para cobrir as Reservas Matemáticas de seus aposentados.

A partir dessa data, teve início uma verdadeira 'via crucis' para os mais de nove mil aposentados e suas respectivas famílias, que após contribuírem durante décadas com valores extras para garantir uma velhice tranqüila, em razão da irresponsabilidade, para não dizer, má-fé, de altos funcionários do Ministério da Previdência, mancomunados certamente, com diretores da Varig e do próprio Aerus, passaram a receber entre dez e cinqüenta por cento do que recebiam normalmente; situação que prevalece até os dias atuais.

Todas as denúncias já haviam sido compiladas em textos sobejamente suportados por provas irrefutáveis da responsabilidade do governo federal, via Ministério da Previdência, e assim, foi apresentada ao judiciário, através da já referida ação pública, de 2004.

No momento em que ocorreu a redução da suplementação, em abril de 2006, foi requerida a antecipação dos efeitos da Tutela, obrigando a União a se responsabilizar pela complementação das aposentadorias. Após a primeira recusa do judiciário, foi interposto Agravo de Instrumento, que resultou em sentença favorável exarada pela Desembargadora Federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Dra. Neusa Alves da Silva, em 18/07/2006.

Segundo a decisão, a União deveria se responsabilizar pelo pagamento das suplementações dos aposentados Varig, até então a cargo do Instituto Aerus de Seguridade.

O processo em questão, é o de nº 200601000164344 (TRF da 1ª Região), dele constando a sentença da Desembargadora, com observações pertinentes a responsabilidade da União, como nos seguintes trechos:

'.........cuja responsabilidade administrativa está diretamente vinculada à Secretaria de Previdência Complementar, órgão do Ministério da Previdência Social. Com efeito, a referida Secretaria tem a obrigação de fiscalizar os atos administrativos praticados pelos gestores do orçamento que lhe fora confiado pelos contribuintes do Fundo de Previdência, sejam eles, os contribuintes participantes ou patrocinadora'

'A atividade de fiscalização engloba também o conhecimento dos atos inerentes a administração e a destinação que vinham sendo aplicados ao saldo do fundo'

'Há fumus boni júris, sim, diante da prova indiciária até aqui oferecida, que poderá ser confirmada ou infirmada no decorrer da instrução'

'Quanto ao periculum in mora, é inafastável, olhando a questão sob o prisma do prejuízo imediato causado aos participantes do plano, estes que, com certeza não deram causa ao 'débâcle' do sistema, não podendo, nem devendo ser atingidos pelos problemas ocasionados por sua péssima gerência'

'Acresça-se a essas considerações, o fato de constituir, o pagamento dos benefícios pleiteados, verba de caráter eminentemente alimentar, o que reforça a conclusão na direção da concessão da liminar reivindicada'

O governo federal, por mais incrível que possa parecer, ignorou solenemente a sentença, e conseqüentemente, a própria justiça, da qual se arvora autêntico paladino. Fez pouco caso do judiciário e de nós, pobres aposentados que ficamos a ver navios, ou seja: continuamos a receber apenas uma pequena parte daquilo que seria devido! Daquilo que deveria ser garantido pelo governo! Afinal, será que alguém se recorda ainda, para que servem os órgãos fiscalizadores mantidos pela União?

Conforme já dissemos acima, o governo se esquece que o acontecido com os nove mil aposentados da Varig, é apenas um exemplo da fragilidade da garantia que ele mesmo se propõe a dar a todos que investem em previdência complementar, senão vejamos:

A SUSEP está para os investidores em planos de previdência abertos, como a SPC para os investidores em previdência fechada, portanto, é mais que justo supor que pessoas da mesma estirpe, dirigem as duas entidades, já que ambas são vinculadas a ministérios, sendo a SUSEP ao Ministério da Fazenda e a SPC ao Ministério da Previdência.

Continuando o raciocínio, podemos estar certos de que, caso ocorram contratempos com as mega empresas financeiras que patrocinam os planos de previdência complementar, dentre elas os principais bancos privados do país, o governo deixará órfãos, mais de 5 milhões de pessoas que de boa fé contribuem mensalmente, esperando receber um bom pecúlio na aposentadoria.

O sistema de previdência complementar no Brasil acumula hoje, algumas centenas de bilhões de reais, imensa fortuna, aplicada nos diversos fundos de investimentos, o que cria uma cadeia de dependência muito grande em nossa economia.

Imaginemos uma crise financeira interna, assim como ocorre ainda em continuidade nos Estados Unidos, nos dias atuais, onde grandes bancos, como City, Merril Lynch e outros, contabilizam fabulosos prejuízos. Podemos garantir que isso não é tão difícil de acontecer, pois como diz o velho e sábio adágio: 'quanto maior o tamanho, maior a queda'. Lembremos os casos de mega instituições como Banco Econômico, Banco Nacional, Bamerindus, Auxiliar e outros, falidos, em um passado recente.

A SUSEP, conforme já dito, é o órgão fiscalizador do sistema de previdência complementar aberta, porém, não há garantia nenhuma, a partir da vergonha que foi a fiscalização similar da SPC sobre os planos de previdência fechada, que esse órgão está de fato, fiscalizando. Mais ainda, em caso de crise, a SUSEP ficará ao lado de quem? Dos investidores que vem colocando seu suado dinheirinho mensalmente nos fundos de previdência, ou dos poderosos banqueiros, como fez o próprio governo federal, criando um barco salva vidas, chamado PROER para salvar banqueiros falidos?

Infelizmente, contrariamente ao procedimento ideal em uma plena democracia, tão propalada pelo nosso mui digno Presidente da República, o governo só age sob pressão, ou constrangimento. Ora, quem possui os quesitos necessários para pressionar e constranger, será sempre o chamado 'quarto poder'. Mas a mídia, só dá destaque aos grandes escândalos ou grandes desgraças, que causam comoção popular, como o recente caso do assassinato da pequena Isabella! Não interessa a ela (mídia), notícias consideradas menores, sem muito clamor popular, como é o caso dos nove mil aposentados da Varig, que ao contrário dos beneficiados com a tal 'bolsa família', concedida pelo governo para remunerar pessoas que nada produzem além de filhos, trabalharam uma vida inteira, pagando mensalmente valores relevantes, para terem uma digna aposentadoria, e foram simplesmente roubados pelo próprio governo que apoiou e endossou todas as falcatruas da antiga Varig.

O tal programa 'bolsa família' custa aos brasileiros, cerca de R$ 1,25 bilhões por mês! Já a complementação aos aposentados da Varig, que o governo deveria honrar, segundo sentença promulgada pela justiça, custaria menos de 2% desse valor.

Os aposentados da Varig não pedem, e nem querem esmolas, ou favores políticos! Querem, isto sim, a devolução, em forma de complementação de aposentadoria, do que pagaram com muito sacrifício durante anos a fio!

Por outro lado, a complementação determinada na sentença, seria provisória, já que todos os beneficiários contam com idade acima de 65 anos e, portanto, com pequena expectativa de vida.

Hoje, morrem cerca de 280 desses aposentados por ano, e como o benefício termina com a morte, essa complementação legal, seria certamente, decrescente e finita.

Ao contrário do que se espera, no entanto, a mídia critica, ao invés de apoiar, como no caso da revista Carta Capital de 30 de abril, em matéria assinada por Rodrigo Martins, falando sobre o estoicismo de um verdadeiro herói, que aposentado, aos 75 anos de idade, ainda tem disposição para lutar contra a injustiça do governo, que o relegou, assim como aos seus mais de 9 mil colegas, a esta situação de humilhação e descaso.

Ele certamente não está atrás dos tais '5 minutos de fama' como sugere a matéria! Na verdade, se ele comparece aos locais de tragédia, certamente não é para se promover pessoalmente e sim, por saber que somente em locais como esse, pode ser visto pelos 'urubus' da mídia, que de forma indireta, podem divulgar aos quatro ventos, o descaso governamental, para com cidadãos honrados como ele. Eis um resumo da matéria:

'Alguns curiosos não escondem o desejo de aparecer diante das câmeras. Ora fantasiado de anjo, ora de caveira, o aposentado Amaury Guedes, de 75 anos, busca os holofotes para advogar sua causa. 'Quero aproveitar essa tragédia para divulgar a minha e de outros 8 mil funcionários mantidos pelos fundos de pensão Aeros e Aerus, que estão morrendo de fome por não receber os benefícios', diz o ex-comissário da Varig, pouco antes de reclamar da falta de atenção da mídia. O desdém dos repórteres não é por acaso. Há tempos, Guedes utiliza a mesma estratégia. Já esteve fantasiado, por exemplo, no desabamento da Linha Amarela do Metrô e ao lado dos destroços do avião da TAM'

Diante da intransigência do governo e do descaso da mídia, um grupo de aposentados da Varig, planeja para breve, a tomada de algumas ações efetivas, tanto quanto radicais, como:

- Greve de fome em Brasília, que no caso dos idosos, todos com mais de 65 anos, equivale a um suicídio coletivo.

- Campanha durante a greve, pelo cumprimento da sentença, através de cartazes elucidativos, denunciando à população, os fatos como eles são.

- Envio de cópia desta matéria à Revista Veja, que tem sido porta-voz da população, denunciando atitudes graves e esquivas do governo.

- Realização de uma campanha nacional, já que os aposentados da Varig residem em diversos estados da União, para que a população deixe de investir em sistemas de Previdência Complementar, uma vez que comprovadamente, o governo nada garante.

A troca de idéias sobre as ações acima, vem sendo realizadas através de uma comunidade do ORKUT, denominada 'Comissários/as aposentados Varig' Tópico ' Urgente-Aerus sob intervenção' (fórum).

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