quinta-feira, 6 de setembro de 2007

22 MINUTOS

Christina Fontenelle
06/09/2007


Foi um registro deste BLOG que, primeira e exclusivamente, alertou que haviam sido suprimidos cerca de 22 minutos de degravação dos diálogos ocorridos na cabine do Airbus A320 da TAM que fazia o vôo 3054 e que se acidentou no último mês de julho, matando 199 pessoas. Quando estes diálogos foram apresentados pela primeira vez na CPI do Apagão da Câmara, foi divulgado que se referiam aos 12 minutos finais antes do acidente. Entretanto, observando-se as marcações de horário que precedem as frases descritas, notava-se que, na verdade, tratavam-se dos últimos 30 minutos de degravação, dos quais teriam sido suprimidos, cerca de 22 minutos (entre as 18:20:39,3 e as 18:43:04,3 horas), restando, portanto 8 minutos (estes, sim, revelados) e não 12 como tinha sido divulgado.

As informações foram sendo repassadas até que a pressão dos familiares das vítimas sobre os deputados encarregados da CPI do Apagão, e a deles mesmos sobre os órgãos responsáveis, acabaram por fazer com que, na última terça-feira os deputados tivessem tido acesso aos completos 30 minutos finais dos diálogos ocorridos na cabine do Airbus. Desta vez, eles ouviram o conteúdo e, ao que parece, não houve transcrição. Entre as duas revelações (01/08 e 04/09), passaram-se 33 dias.
No dia 21 de agosto, eu entrei em contato com o setor de Comunicação da Aeronáutica e falei sobre o assunto “22 minutos omitidos” com o tenente Silva, pessoa encarregada de transmitir opiniões oficiais da Força Aérea a mim. Do tenente recebi a explicação de que naqueles 22 minutos não haveria informações que pudessem ser consideradas relevantes para a investigação e que, por este motivo, não haviam sido integradas à transcrição apresentada na CPI da Câmara. Eu argumentei que não havia coerência no fato de a Aeronáutica apresentar à CPI um documento tão detalhado e cheio de minúcias, como o que fora apresentado na CPI com as transcrições dos diálogos, registrando inclusive os menores ruídos (e os identificando com descrições) e omitir uma informação, nesse mesmo documento, dando satisfação sobre minutos que teriam sido omitidos.

O pobre do tenente apenas repetiu o que já havia dito – ou seja, não respondeu a pergunta. E ele não poderia ter feito outra coisa mesmo. Na verdade, eu pedi, por três vezes, para falar com o chefe do Cenipa, o Brigadeiro Kersul. Digamos que eu tenha sido solenemente enrolada. Apesar disso, dias depois, quando o Brigadeiro Jorge Kersul chorou em sessão da CPI, eu cumpri com as minhas obrigações e escrevi uma
matéria defendendo não somente muitos de seus posicionamentos como também todo o trabalho dos homens da Força Aérea (e de todos os profissionais) envolvidos no resgate dos corpos das 154 vítimas de outra recente tragédia da aviação brasileira – o acidente que derrubou o Boeing da Gol, em setembro de 2006. O julgamento sobre esta questão ficará com os leitores.

Finalmente, 33 dias depois de terem ouvido apenas 8 minutos (entrecortados por 22 minutos) do áudio da cabine do Airbus A-320 TAM, os deputados da CPI do Apagão da Câmara ouviram 22 minutos que faltavam. Eles deixaram o Cenipa dizendo que os últimos minutos registrados na caixa-preta são muito dramáticos e afirmaram que o áudio não trouxe novos elementos para as investigações. O relator Marco Maia (PT-RS) disse ainda que "Escutando a caixa preta, a conclusão é de que os pilotos tinham uma consciência situacional muito alta sobre o que eles estavam fazendo e realizando. O piloto Kleyber Aguiar Lima e o co-piloto Henrique Stephanini di Sacco estavam ligados nos procedimentos realizados para o pouso e ligados nos equipamentos".


Disso eu nunca tive a menor dúvida e sempre afirmei e reafirmei que a hipótese de imputar culpabilidade aos pilotos era, no mínimo, uma covardia.


Segundo matéria divulgada pelo Estadão de 04/09, “Os primeiros 20 minutos de gravação da caixa preta do Airbus são praticamente inaudíveis, segundo integrantes da CPI. O piloto aparece reclamando de dor de cabeça e há momentos de silêncio absoluto, que duraram cerca de quatro minutos. Isso chamou a atenção do deputado Eduardo Cunha. "Ficamos com um vazio. A sensação de que está faltando alguma coisa", observou o peemedebista. "Em muitos momentos realmente não há dialogo, mas as autoridades da Aeronáutica nos explicaram que esse é um procedimento normal. É pouco provável que eles tivessem muito o que conversar", disse Gustavo Fruet. "Não tem diálogo, mas há o som ambiente, ruídos de fundo. Não suspeito que tenham apagado parte do som", afirmou a deputada Luciana Genro.” Foi a deputada, também, que na mesma matéria falou que “o alarme avisando que o manete não está na posição idle não parou de tocar enquanto o piloto não colocou o manete na posição correta. "O computador com o alarme só parou quando o piloto pôs em idle", disse a deputada.”

Bem, eu devo repetir o que disse no final da matéria em que descrevi sobre as informações obtidas com a Aeronáutica a respeito dos 22 minutos que faltavam entre os 30 minutos finais de degravação divulgados da primeira vez na CPI do Apagão da Câmara: “Eu tenho procurado ser justa nas minhas matérias e nos artigos que escrevo. Costumo apontar os acertos e os erros. Algumas pessoas dizem que eu não entrevisto, eu sabatino. Não é bem assim. É que eu procuro estudar bem minhas pautas. Como não pude, ainda, entrevistar o Brigadeiro Kersul, não me dou por satisfeita...”

E eu continuo não satisfeita porque a mim faltam ser respondidas as seguintes questões:

1. Se a gravação sempre esteve no Cenipa, por que demoraram 33 dias para permitir que os deputados a ouvissem por inteiro?

2. Se não havia nada de relevante – apenas silêncio da tripulação, intercalados por barulhos ambientes ao fundo e diálogos que em nada contribuiriam para denegrir a imagem nem dos pilotos nem da Companhia TAM – por que, então, teria havido o corte na primeira divulgação?

3. Que alarme é esse que foi ouvido, fazendo referência à manete que não estaria na posição IDLE, se a própria
TAM reconheceu que nenhuma de suas aeronaves possuía (ainda) esse novo equipamento de alarme específico, cuja instalação só foi SUGERIDA (e não compulsoriamente EXIGIDA) pela Airbus depois que o relatório de recomendações de três outros acidentes com o tipo Airbus A320 em outros países?


Perdoem-me, mas eu sou chata mesmo. Enfim, ainda que tenha havido falha na aeronave (e máquinas falham, para isso existemos estudos de evitar maiores danos em caso de falhas em equipamentos), isso não exime de responsabilidade pela tragédia as condições da pista, que, depois de reformada, estava mais escorregadia e sem as devidas ranhuras e, é claro, não possuía uma área de escape adequadamente preparada para conter aeronaves de grande porte que porventura a “varassem”, como havia sido recomendado ENFATICAMENTE nas reuniões públicas promovidas pela Anac, antes de empreender as reformas na pista de Congonhas.

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