sexta-feira, 3 de agosto de 2007

O QUE SERÁ QUE VEM DEPOIS DA DEMOCRACIA?

Christina Fontenelle
2/08/2007

Esta é uma pergunta que deve estar formigando nos cérebros de historiadores, de cientistas políticos, de jornalistas, de filósofos e de muitos outros cidadãos curiosos. Foi o mandatário da nação que lançou a celeuma ao discursar, na última terça-feira, em Cuiabá (MT), quando, ao comentar sobre as vaias que vem recebendo em público desde que não conseguiu fazer a abertura dos Jogos Pan-Americanos no Maracanã (RJ), disse, entre outras pérolas, que: “Com a democracia não se brinca, o que vem depois dela é sempre muito pior”.

O renomado psicanalista Freud teria deixado em sua obra literário-científica alguma explicação para que um homem que ocupe a presidência da república de um país faça esta retumbante afirmação? Seria um ato falho? Uma revelação de desejos íntimos profundos? Afinal, o que é que vem depois da democracia?

Bem, historicamente, em países do chamado primeiro mundo, depois da democracia, temos visto muito mais coisas boas do que ruins. Liberdade de expressão e conquista de direitos civis são apenas dois da infinidade de exemplos que poderíamos citar como bons resultados trazidos à humanidade graças ao advento da democracia – por mais capenga e defeituosa que possa ser. Mas há um grave problema em relação ao regime, temos que reconhecer. Uma falha que, ao longo dos anos, tem se mostrado cíclica e insolúvel: é que a democracia abre brechas para que “fascisto-comunistopatas” cheguem ao poder e, nele estabelecidos, desejem de lá jamais sair. Isso, realmente, pode vir a ser o futuro de algumas democracias – como efetivamente o foi em países como a Alemanha da época de Hitler – para citar apenas um indiscutível exemplo.

Aliás, para os comunistas, a própria democracia é apenas uma das etapas a ser vencida para o que eles chamam de inexorável ascensão do socialismo – que é um eufemismo para ditadura da nova elite comunista. Seria a frase do presidente Lula um recado para que a população se aquiete e deixe que a revolução vença em doses homeopáticas – sem que seja necessário recorrer ao massacre que, mais cedo ou mais tarde acontecerá?

O presidente deu seu recado numa segunda frase: “Se quiserem brincar com a democracia, ninguém sabe nesse país colocar mais gente na rua do que eu”. Realmente: afinal, milhões e milhões são gastos do seu, do meu e do dinheiro de todos os brasileiros que pagam impostos (e todos eles o fazem, direta ou indiretamente) para sustentar movimentos ditos sociais, justamente para que o senhor presidente possa usá-los para ameaçar o restante dos patrícios que com ele e com seu governo não estiverem satisfeitos.

Deu para entender: podem vaiar à vontade, mas, não passem disso. Caso contrário, Lula será “forçado” a chamar seu bloco para a rua – um imenso bloco com sede de sangue; o Brasil paralelo que vem sendo criado e cultivado há anos (vocês nem imaginam!); brasileiros prontos e armados, dispostos a eliminar da face desta terra tudo e todos para os quais foram doutrinados a achar que não passam de “elite-branca-aproveitadora-repressora-inimiga”. E o recado também serve para as Forças Armadas: estejam a seu lado, posto que os que a ele se opuserem terão de enfrentar as forças revolucionárias que virão de todos os lados: de dentro de nossas fronteiras e de fora delas, do oeste e do norte.

“Se alguém acha que com estupidez vai atrapalhar que a gente faça neste país o que precisa ser feito, pode tirar o cavalo da chuva, porque não conheço nenhum deles que tenha uma biografia que lhe permita sequer falar em democracia nesse país”. Outra pérola proferida pelo presidente que gera dúvidas: que estupidez? A lei dos crimes hediondos, bem como sua penalização, foi abrandada no governo de sua excelência. Então, vaias, flores, cartazes, passeatas ordeiras, minutos de silêncio e coisas do gênero passaram a ser estupidez? De quem sua excelência alega conhecer a biografia? Dos parentes das vítimas dos dois maiores acidentes aéreos desse país? De todos aqueles que têm sido vítimas da crise aérea? De todos aqueles que lotavam o Maracanã na cerimônia de abertura do PAN?

“Eu, um homem que tenho como formação máxima da minha vida um diploma primário e um curso de torneiro mecânico... quando terminar o meu mandato em 2010... vamos passar para a história como o mandato presidencial que mais fez universidade federal nesse país... em 97 anos nesse país, se fez 140 escolas técnicas e, em 8 anos, nós vamos fazer 160. Portanto, isso deve incomodar a muita gente que acha que é a quantidade de anos que se passou na escola que dá a ele a inteligência para conhecer os problemas do povo. Inteligência é uma coisa muito diferente do conhecimento que a gente tem em função da nossa passagem pelas escolas”.

Não. Inteligência não depende de conhecimento – embora a união das duas coisas faça muita diferença - para melhor, geralmente. A maioria das pessoas sabe perfeitamente desta obviedade. Entretanto, sua excelência, o presidente, precisa se decidir de uma vez por todas: se estudo não lhe valeu de nada, assim como também o dos outros de pouco lhe vale, por que investir tanto dinheiro público em tamanha inutilidade? Mas, ao contrário, se tanto lhe importa fazer esse investimento, por que endeusar a inexorabilidade da herança genética que lhe teria privilegiado com uma inteligência nata, todas as vezes em que aborda esse tema? Universidade seria, então, a única saída para que os milhões de brasileiros menos intelectualmente privilegiados chegassem aos pés da sapiência de sua excelência? Para quê? Para, depois, ficar ouvindo que seu estudo de nada lhes teria adiantado?

“Eu não consigo misturar a minha relação pessoal com a questão partidária. Mas, tem gente que não pensa assim. Essa gente que não pensa assim fez a marcha com Deus pela liberdade, em 1964, que resultou no golpe militar. Essa gente que não pensa assim levou Getúlio Vargas ao suicídio. Essa gente que pensa assim levou João Goulart a renunciar. Essa gente que pensa assim ficou contente com os 23 anos de governo militar e está incomodada com a democracia, porque a democracia pressupõe que o pobre tenha direito, pressupõe o pobre ter bolsa família, sim, pressupõe a reforma agrária (que ainda estamos em dívida com os trabalhadores e precisamos fazer mais), pressupõe a gente cuidar para que o pobre da periferia possa chegar à universidade, por que, senão, para que vale governar?”

Uma das vantagens de adquirir conhecimento e cultura através dos estudos ao longo da vida é não proferir asneiras como papagaio – que repete frases feitas sem lhes conhecer o verdadeiro significado e/ou real conteúdo - e nem cometer imperdoáveis confusões com os fatos históricos, com suas causas e com suas conseqüências. Nesse caso, por exemplo, a reação mais natural daqueles que tenham sido privilegiados por herdar geneticamente a qualidade da inteligência, é simplesmente calar-se sobre o tema desconhecido – ou, então, estudá-lo. Nem uma coisa nem outra, realmente é difícil de administrar.

“Eu queria dizer pás (sic) pessoas que não tentem achar que vendendo notinhas pos (sic) jornais de que vai ter uma manifestação contra o presidente em tal lugar, o presidente vai deixar de ir... Deus, quando fez a gente, Ele fez a gente perfeito. A gente tem duas orêia (orelhas), uma é pa escuta vaia, outra pa escuta aplauso (sic). Isso não incomoda. Sobretudo porque os que estão vaiando eram os que mais deveriam estar aplaudindo. Os que estão vaiando foram os que ganharam muito dinheiro nesse país no meu governo. Aliás, a parte mais pobre é que deveria estar mais zangada, porque ela teve menos do que eles tiveram. É só vê quanto ganhô os banqueiro (sic), quanto ganhô os empresários (sic)”.

Como bem disse Jô Soares no seu programa de quarta-feira, o presidente ouve em mono. Tudo bem – vamos dar ao presidente o privilégio da metáfora. O problema é que Lula, ao dizer que quem o esteja vaiando deveria ser quem o estivesse aplaudindo, atribui a estas pessoas a qualidade de “besta quadrada”. Sim, porque somente “bestas quadradas” estariam a vaiar aquele que os tenha enriquecido e dado boa vida. Muito dinheiro? Quantos banqueiros e grandes empresários foram flagrados nas tais passeatas e nos tais lugares onde o presidente foi vaiado?

É uma questão de matemática. Infelizmente, matemática é coisa que se aprende com estudo. São 194 milhões de brasileiros – 126 milhões deles eleitores. O número de banqueiros e de grandes empresários (e dos beneficiados por eles) é ínfimo. O número de agraciados com a bolsa família (deveria ser “ bolsa esmola”) e pelos empregos criados pelo governo petista é de cerca de 12 milhões de pessoas. Mais o pessoal dos movimentos sociais... Sobram, então, aproximadamente, entre 140 e 150 milhões de não beneficiados – possivelmente insatisfeitos. Dizer para essas pessoas que estão a vaiar o governo, na pessoa do presidente, que teriam ganho muito dinheiro é, no mínimo, estender a todas elas as saudações feitas, recentemente, em rede nacional, às vítimas do acidente aéreo com o avião da TAM em Congonhas, e aos parentes das mesmas, pelo assessor da presidência da república para assuntos internacionais, o senhor Marco Aurélio Garcia.

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