por Paulo Moura
cientista político
Aos leitores que notaram o descompasso de meus últimos artigos com os acontecimentos recentes da conjuntura brasileira, informo que estive, por dez dias, fora do Brasil, tendo deixado artigos prontos para cumprir meu compromisso com Diego. Soube apenas superficialmente do acidente com o Airbus da TAM. Ao retornar ao Brasil vivenciei, como Denis Rosenfield descreveu em seu artigo de ontem, minha história pessoal de vítima do caos aéreo.
Mas, nada se compara à emoção e a dor das tristes descobertas que fui fazendo algumas horas após pisar em solo brasileiro. Morreu no acidente da TAM a nora grávida de um amigo pelo qual guardo enorme respeito e admiração pelos anos de convivência fraterna e aprendizado intenso do que sei sobre política. Seu filho, um jovem advogado que conheci profissionalmente, assim como todos os seus familiares, jamais serão reparados pela dor dessa perda, agravada pela eventual impossibilidade de uma cerimônia fúnebre com o corpo presente de seu ente querido.
O senhor Marco Aurélio é gaúcho de nascimento e iniciou aqui sua carreira política no movimento estudantil, tendo convivido com meu professor. Seu gesto obsceno, se já não fosse grave e emblemático indicador da demência de nossos governantes, é estúpida, insensível e injustificável agressão adicional à dor das famílias vítimas. O impacto desse gesto, por razões evidentes, foi mais pesado ainda para os membros dessa família em especial. Difícil conter as lágrimas ao ouvir meu amigo ao telefone descrevendo sua dor, e novamente agora, ao escrever essas linhas.
Para Lula e seus séqüito de burocratas, animais políticos no mais primitivo e degradante sentido da expressão, tudo se resume a livrarem-se da punição pelo crime doloso que cometeram e cometem nos dois acidentes e na gestão do caos aéreo nacional.
Os gabinetes de crise que o governo e a TAM montaram, não visam consertar o caos que produzem, mas à proteção dos danos às suas respectivas imagens. Cabeças vazias são entregues aos leões, versões improvisadas que não resistem poucas horas para as causas do acidente, e conhecidas táticas diversionistas de contra-informação e desorientação da opinião pública vêm sendo usadas para proteger os culpados pelo acidente GOL, e novamente no caso da TAM. A impunidade é a meta dos responsáveis. Poder e dinheiro estão acima de tudo para essa gente hipócrita. As declarações de Lula evidenciam textos e roteiros meticulosamente construídos por marqueteiros inescrupulosos com o único objetivo de evitar que a imagem do "pai dos pobres" seja prejudicada pela revelação de seu verdadeiro conteúdo oculto, prenhe de podridão moral.
Segundo o Dicionário Aurélio o significado jurídico do termo "dolo" é: "Vontade conscientemente dirigida ao fim de obter um resultado criminoso ou de assumir o risco de o produzir.
"Menos de 24 horas após chegar ao Brasil, recebi por e-mail a gravação do trecho de um discurso que o deputado Júlio Redecker (PSDB/RS) fez no Congresso Nacional sobre o acidente com o Boeing da GOL, denunciando a responsabilidade do governo Lula, na figura da Casa Civil da Presidência da República, sobre as mortes daquela tragédia. Segundo a denúncia documentada do deputado, houve deliberado contingenciamento de verbas para modernização dos aeroportos, desde 2005, mesmo diante dos reiterados alertas de técnicos envolvidos na avaliação do setor, de que acidentes aéreos ocorreriam como conseqüência dessa decisão.
De forma trágica e involuntária, o deputado Redecker vaticinou sua morte, provando com o sacrifício da própria vida a acusação de assassinato doloso que recai sobre os ombros dos responsáveis por esse desgoverno e pelas companhias aéreas. Em meio ao mar de mediocridade e corrupção que reina sobre o parlamento brasileiro, o deputado Redecker, a quem conheci profissionalmente, era uma digna e honrosa exceção. Líder vocacionado para o poder, marcado por sólidas convicções morais, preparo técnico e intelectual, inclusive com formação acadêmica no exterior, o deputado tucano tinha todas as qualidades para exercer mandato executivo a testa de um governo estadual, ministério e, no futuro, mesmo a Presidência da Republica, se o destino lhe oferecesse essas oportunidades. A dor de sua família não é menor que a dos demais familiares das outras vítimas. Sua morte priva-nos, como cidadãos brasileiros, também da esperança de que um dia líderes dignos da grandeza moral que deve pautar a conduta dos homens públicos voltem a nos governar.
Desde os tempos da agonia da Varig, protagonizada pela estupidez de seus gestores e somada aos noticiados lobbies de ilustres petistas interessados na intermediação da sua venda para TAM, evidencia-se pela forma como autoridades lidam com uma crise dessa gravidade, que a mão da corrupção contamina com irracionalidade as decisões que pautam os inescrupulosos interesses políticos e econômicos dos abutres que tripudiam sobre a tragédia das vítimas e da nação vilipendiada. Ironia do destino confirma o dito chinês que lembra que pactos entre ladrões terminam no minuto seguinte ao roubo, na hora da partilha do butim.
A se confirmar a denúncia de que a redução da pista de Congonhas para a construção de um hotel teria sido autorizada pelo governo de Marta Suplicy, mais uma ré e outros tantos réus devem contas à Justiça Criminal, às famílias da vítimas e à nação. Dispensável nomear o responsável número por esses e tantos outros crimes de lesa pátria que desfilam pelo noticiário desde as denúncias de Roberto Jefferson.
Mas, as companhias aéreas, movidas pela cobiça de ocuparem o vácuo deixado pela Varig, têm sua parcela de culpa nesse descalabro. No dia 24 passado, ao retornar ao Brasil, embarquei num Airbus da TAM, igual ao acidentado em Congonhas, no aeroporto de Cumbica. Em meio ao caos no saguão do aeroporto, répteis furavam a fila de check in dos participantes do programa de "fidelidade vermelha" da TAM, com a cumplicidade passiva de uma funcionária que se negava, agredindo verbalmente passageiros indignados, a fornecer sua identificação completa para denúncia aos órgãos competentes.
O vôo, com decolagem prevista para as 07:50, encontrava-se na cabeceira da pista às 09:30, quando recebeu ordem de retornar ao pátio de embarque, pois um ônibus que transporta passageiros dos portões térreos do aeroporto, perambulava pela pista desorientado em busca do avião no qual deveria despejar 40 cidadãos brasileiros esquecidos pela TAM. Segundo admitiu uma "voz feminina" da TAM, no alto-falante do avião, a tripulação havia sido informada pelo setor de embarque da própria companhia, que os passageiros já embarcados compunham o total a ocupar a aeronave para aquela viagem.
Como se não bastasse, diante dos comentários estupefatos dos passageiros, "uma voz masculina" da TAM na aeronave, abandona o script padrão das orientações obrigatórias antes da decolagem e, ao pedir, em linguagem coloquial e debochada, a atenção dos passageiros para o VT com as instruções de segurança, comete um erro técnico de operação do aparelho de vídeo e afirma no alto-falante: "Eu sempre erro isso aqui". E ri como quem ignora o risco de morte iminente de todos os embarcados, do qual poderia se tornar vítima. E cúmplice.
Ninguém me contou. Meus familiares e eu vivemos. E, felizmente, sobrevivemos.
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