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28 de julho de 2007
Por Carina Rabelo, Claudia Jordão, Daniela Mendes, Lena Castellón, Mônica Tarantino e Rodrigo Cardoso (*)
(*)Fonte: http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/1970/artigo57107-1.htm
Os brasileiros externaram sua indignação e sua dor através de faixas nas ruas e nos aeroportos: Lula e o governo foram cobrados pela população cansada do caos aéreo.
Unidos em torno das famílias das vítimas do vôo 3054, os brasileiros protestam contra o caos aéreo, pilotos e empresas boicotam o Aeroporto de Congonhas e a OAB lidera campanha para parar o País por um minuto
Pouco importa se a dor foi extravasada com delicadeza, como na tarde da terça-feira 24, quando os familiares das vítimas do vôo 3054 levaram flores ao balcão da TAM, em Congonhas, uma semana depois do acidente que matou 199 pessoas. Tanto faz se o desconforto se revestiu com humor, como no pequeno grupo de passageiros que desfilou com nariz de palhaço no Aeroporto Tom Jobim, no Rio de Janeiro, para chamar a atenção para os atrasos e descasos da Gol. Mesmo quando o protesto foi explícito, como nas manifestações que tomaram o salão do Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, de onde partiu o vôo, ou a avenida Washington Luiz, em São Paulo, onde se deu a tragédia, havia sempre um sentimento maior a unir cada movimento, cada reclamação, cada desespero individual a uma multidão de brasileiros igualmente revoltados. Enquanto as autoridades passaram a semana eximindo-se das próprias responsabilidades, das cinzas do maior acidente aéreo da história do País, ergueu-se um Brasil indignado.
É como se a inépcia do poder público, manifestada no sarcasmo dos gestos obscenos dos assessores e nas declarações de ministros que beiram a chacota, tivesse despertado novamente a sociedade civil – aquela entidade que, convertida em multidão, toma forma para ocupar ruas e praças e dizer aos governantes que basta, é preciso mudar. Foi assim nas Diretas-Já, foi assim no impeachment de Fernando Collor e começa a ser assim outra vez, depois de 353 mortos nos dois piores acidentes do Brasil e dez meses de caos aéreo que afetam o cotidiano de pessoas, famílias, empresas.
Como forma de garantir a própria segurança, pilotos de diferentes companhias boicotaram Congonhas, despertados da letargia pelo texto que um comandante da TAM, que na véspera do desastre havia voado no mesmo Airbus, postou na internet. “Estou bastante abalado e indignado. Na noite do dia 16 (...), o avião aquaplanou e eu tomei (...) um dos maiores sustos em meus 17 anos de aviação profissional. Gostaria que (...) os (ir)responsáveis por esta crise (...) tivessem a carade- pau de dizer que a pista de Congonhas não tem problemas”, escreveu na sexta- feira 20. Em seguida, algumas empresas decidiram não mais aterrissar lá. A TAM decidiu não mais usar, sob chuva, a pista principal. A BRA deixou de operar em Congonhas.
A reação da sociedade civil, contudo, começou muito antes do boicote dos pilotos e, dessa vez, foi capitaneada por empresas preocupadas com seus funcionários. Dois dias depois do acidente, o grupo Record avisou que artistas e funcionários não voam mais por Congonhas quando estiverem a trabalho. “É um protesto contra o descaso, contra a falta de ação dos responsáveis, governo federal, Aeronáutica, Infraero, Anac, companhias aéreas...”, apontou o comunicado da Record. O clube Palmeiras anunciou que até o final do Campeonato Brasileiro jogadores só viajarão por Cumbica, em Guarulhos (SP). A rede de supermercados Wal Mart recomendou a seus 55 mil funcionários não utilizarem o aeroporto central de São Paulo. E a empresa de softwares Sigma Dataserv, com sede em Curitiba, suspendeu as compras e reservas de vôos que passem por Congonhas. “Não podemos mais arriscar vidas”, diz Luis Coimbra, diretor da companhia.
Pouco importa se a dor foi extravasada com delicadeza, como na tarde da terça-feira 24, quando os familiares das vítimas do vôo 3054 levaram flores ao balcão da TAM, em Congonhas, uma semana depois do acidente que matou 199 pessoas. Tanto faz se o desconforto se revestiu com humor, como no pequeno grupo de passageiros que desfilou com nariz de palhaço no Aeroporto Tom Jobim, no Rio de Janeiro, para chamar a atenção para os atrasos e descasos da Gol. Mesmo quando o protesto foi explícito, como nas manifestações que tomaram o salão do Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, de onde partiu o vôo, ou a avenida Washington Luiz, em São Paulo, onde se deu a tragédia, havia sempre um sentimento maior a unir cada movimento, cada reclamação, cada desespero individual a uma multidão de brasileiros igualmente revoltados. Enquanto as autoridades passaram a semana eximindo-se das próprias responsabilidades, das cinzas do maior acidente aéreo da história do País, ergueu-se um Brasil indignado.
É como se a inépcia do poder público, manifestada no sarcasmo dos gestos obscenos dos assessores e nas declarações de ministros que beiram a chacota, tivesse despertado novamente a sociedade civil – aquela entidade que, convertida em multidão, toma forma para ocupar ruas e praças e dizer aos governantes que basta, é preciso mudar. Foi assim nas Diretas-Já, foi assim no impeachment de Fernando Collor e começa a ser assim outra vez, depois de 353 mortos nos dois piores acidentes do Brasil e dez meses de caos aéreo que afetam o cotidiano de pessoas, famílias, empresas.
Como forma de garantir a própria segurança, pilotos de diferentes companhias boicotaram Congonhas, despertados da letargia pelo texto que um comandante da TAM, que na véspera do desastre havia voado no mesmo Airbus, postou na internet. “Estou bastante abalado e indignado. Na noite do dia 16 (...), o avião aquaplanou e eu tomei (...) um dos maiores sustos em meus 17 anos de aviação profissional. Gostaria que (...) os (ir)responsáveis por esta crise (...) tivessem a carade- pau de dizer que a pista de Congonhas não tem problemas”, escreveu na sexta- feira 20. Em seguida, algumas empresas decidiram não mais aterrissar lá. A TAM decidiu não mais usar, sob chuva, a pista principal. A BRA deixou de operar em Congonhas.
A reação da sociedade civil, contudo, começou muito antes do boicote dos pilotos e, dessa vez, foi capitaneada por empresas preocupadas com seus funcionários. Dois dias depois do acidente, o grupo Record avisou que artistas e funcionários não voam mais por Congonhas quando estiverem a trabalho. “É um protesto contra o descaso, contra a falta de ação dos responsáveis, governo federal, Aeronáutica, Infraero, Anac, companhias aéreas...”, apontou o comunicado da Record. O clube Palmeiras anunciou que até o final do Campeonato Brasileiro jogadores só viajarão por Cumbica, em Guarulhos (SP). A rede de supermercados Wal Mart recomendou a seus 55 mil funcionários não utilizarem o aeroporto central de São Paulo. E a empresa de softwares Sigma Dataserv, com sede em Curitiba, suspendeu as compras e reservas de vôos que passem por Congonhas. “Não podemos mais arriscar vidas”, diz Luis Coimbra, diretor da companhia.
Em artigo publicado na quinta-feira 26, os coordenadores do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marilena Lazzarini e Marcos Pó, defenderam o boicote ao aeroporto até que seja feita uma avaliação independente sobre as condições de operação. De acordo com eles, o grau de respeito aos consumidores por empresas privadas e pelo governo é indicador do avanço social da sociedade. “Se o Brasil deseja ser um país avançado, já passou da hora de cuidar disso”, escreveram.
Cidadãos das mais diversas cidades estão avançando nessa mobilização por segurança, competência e qualidade nas decisões do governo. Em São Paulo, entidades como a SOS Mata Atlântica e a Campanha Rir Para Não Chorar organizaram uma caminhada do Monumento às Bandeiras – um dos símbolos da capital paulista – ao aeroporto de Congonhas para apoiar as famílias, homenagear os bombeiros e criticar a falta de soluções. O mote do movimento é “A sociedade brasileira exige respeito”. O ato foi convocado para o domingo 29, com as pessoas vestidas de roupas pretas. “Já participei de diversos atos e espero que este recrute os brasileiros a pressionar pela segurança aérea”, desabafa Sergio Morisson, do Rir Para Não Chorar. “Atingimos nosso limite.”
Movimento “A Sociedade Exige Respeito” organiza caminhada no domingo 29 e famílias fazem sete minutos de silêncio pelas vítimas em Porto Alegre uma semana depois do acidente.
Veiculada pela mesma internet que permitiu às companhias mudar o sistema de venda de passagens aéreas, uma grande manifestação nacional está sendo programada para 4 de agosto. Ela reunirá pessoas em lugares como a avenida Paulista (SP), a Cinelândia (RJ) ou o Aeroporto Juscelino Kubitschek (Brasília). Outra mais ousada recebeu o nome de “No Fly Day”, ou um dia sem aviões. Os criadores convocam os brasileiros a não viajar no dia 18 de agosto. Os dois movimentos começaram pelo Orkut.
Cidadãos das mais diversas cidades estão avançando nessa mobilização por segurança, competência e qualidade nas decisões do governo. Em São Paulo, entidades como a SOS Mata Atlântica e a Campanha Rir Para Não Chorar organizaram uma caminhada do Monumento às Bandeiras – um dos símbolos da capital paulista – ao aeroporto de Congonhas para apoiar as famílias, homenagear os bombeiros e criticar a falta de soluções. O mote do movimento é “A sociedade brasileira exige respeito”. O ato foi convocado para o domingo 29, com as pessoas vestidas de roupas pretas. “Já participei de diversos atos e espero que este recrute os brasileiros a pressionar pela segurança aérea”, desabafa Sergio Morisson, do Rir Para Não Chorar. “Atingimos nosso limite.”
Movimento “A Sociedade Exige Respeito” organiza caminhada no domingo 29 e famílias fazem sete minutos de silêncio pelas vítimas em Porto Alegre uma semana depois do acidente.
Veiculada pela mesma internet que permitiu às companhias mudar o sistema de venda de passagens aéreas, uma grande manifestação nacional está sendo programada para 4 de agosto. Ela reunirá pessoas em lugares como a avenida Paulista (SP), a Cinelândia (RJ) ou o Aeroporto Juscelino Kubitschek (Brasília). Outra mais ousada recebeu o nome de “No Fly Day”, ou um dia sem aviões. Os criadores convocam os brasileiros a não viajar no dia 18 de agosto. Os dois movimentos começaram pelo Orkut.
Mas nada se compara, em termos de organização, ao protesto simples, simbólico e silencioso que pretende fazer com que tantos brasileiros quanto possível parem durante um minuto, com a mão sobre o peito, no coração, no dia em que a tragédia completar seu primeiro mês. Apenas um minuto sem palavras, com as pessoas em pé, a mão sobre o coração, suspendendo suas atividades para deixar claro que a população não suporta mais a sucessão de crises que se abate sobre o Brasil. E está indignada com a falta de medidas efetivas contra o caos aéreo, a corrupção, as CPIs sem soluções.
Encabeçada pela OAB, a Ordem dos Advogados do Brasil, a manifestação pretende ser um movimento de resgate da cidadania e de solidariedade às famílias atingidas, mas pode-se entendêla também como uma resposta à atitude de autoridades que não respeitaram a dor de quem perdeu pais, companheiros, filhos, amigos. “Há uma insatisfação generalizada diante do marasmo em que o Brasil se encontra, diante da série de episódios que geram angústia e indignação”, diz Luiz Flávio
Borges D´Urso, presidente da seção paulista da OAB. “Não é só de quatro em quatro anos que devemos exercer a cidadania.” Chamado de Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, o ato teve sua largada na semana passada, com o lançamento da campanha publicitária que destaca a expressão “cansei”, verbalização do estado de esgotamento da população.
Ao contrário de outros grandes movimentos da sociedade civil, dessa vez a mobilização passa ao largo dos políticos, para não dizer apesar deles. “Isto é um movimento de cidadão para cidadão”, diz Marcos Haddad, do grupo Jovens Líderes, da Fiesp. “É uma demonstração de civismo, de conscientização.”
Ao contrário de outros grandes movimentos da sociedade civil, dessa vez a mobilização passa ao largo dos políticos, para não dizer apesar deles. “Isto é um movimento de cidadão para cidadão”, diz Marcos Haddad, do grupo Jovens Líderes, da Fiesp. “É uma demonstração de civismo, de conscientização.”
Além da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a iniciativa tem o apoio da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) da Associação Comercial de São Paulo e do Conselho Regional de Medicina.A indignação não é solução, mas um caminho para o País voltar a funcionar com um mínimo de tranqüilidade depois de meses de trauma coletivo. “A paz interior só virá com atitudes e medidas concretas”, analisa a psicóloga Mara Raboni, especialista em stress pós-traumático da Universidade Federal de São Paulo. “Não adianta o governo trocar nomes dos titulares de pastas. É necessário que a situação mude de fato, que a segurança aumente e que o acidente seja esclarecido.” Ela acrescenta que nos Estados Unidos – até hoje abalado pelos ataques de 11 de setembro – são comuns as manifestações em nome da dor das pessoas que sofreram perdas.
Passeatas, monumentos, marcos e datas ajudam a diminuir a revolta e o sentimento de impotência da população. No caso do Brasil, aconteceu o contrário, um agravante decorrente da série de atos das autoridades que soaram ofensivos à memória das vítimas da tragédia do vôo 3054 e aos passageiros vilipendiados no seu direito de ir-e-vir com segurança. “A morte abrupta por acidente é um luto difícil de elaborar, uma violência que a mente não tem condições de processar”, diz o psicanalista Edgar Diefenthaeler, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em luto, ele explica que a primeira reação é a raiva, a revolta: “Amigos e familiares devem mostrar que compreendem o que se passa. E também deve haver uma atitude respeitosa e de silêncio.”
Passeatas, monumentos, marcos e datas ajudam a diminuir a revolta e o sentimento de impotência da população. No caso do Brasil, aconteceu o contrário, um agravante decorrente da série de atos das autoridades que soaram ofensivos à memória das vítimas da tragédia do vôo 3054 e aos passageiros vilipendiados no seu direito de ir-e-vir com segurança. “A morte abrupta por acidente é um luto difícil de elaborar, uma violência que a mente não tem condições de processar”, diz o psicanalista Edgar Diefenthaeler, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em luto, ele explica que a primeira reação é a raiva, a revolta: “Amigos e familiares devem mostrar que compreendem o que se passa. E também deve haver uma atitude respeitosa e de silêncio.”
Para a empresária Michele Pedreira, de São Paulo, a posição das autoridades foi o que mais a revoltou. Ela estava casada havia cinco anos com Marcelo Pedreira, um dos passageiros mortos na tragédia. Seu depoimento: “O comportamento do governo e da Infraero me indignaram. A demora em recebermos informações foi um desrespeito. E houve uma falta de sensibilidade generalizada. No dia do acidente, liguei das 19h até meia-noite para a TAM sem conseguir confirmar se meu marido estava no vôo. Fui tratada até com indelicadeza.” Outros familiares das vítimas carregam consigo a mesma indignação. E expressam nestas páginas de ISTOÉ, com a mão no coração, o protesto pela situação em que se encontram.
No hotel onde os parentes das vítimas estão hospedados, em São Paulo, as histórias pessoais são um retrato da lentidão da burocracia, do poder da influência e do receio da falta de justiça – muitos dos muitos males cotidianos que tanto indignam os brasileiros. O professor Dario Scott, de São Leopoldo (RS), pai de Thaís Scott, 14 anos, morta no acidente, ficou espantado que a Anac só tenha enviado uma assessora para visitá-los uma semana após a tragédia. “Eles são tão incompetentes que devem ter demorado para descobrir onde as famílias estavam”, critica.
Os familiares vão protocolar um documento na promotoria da Justiça do Consumidor para garantir alguns direitos. Não querem, depois, se sentir lesados pela negligência oficial ou pela lentidão da lei. “Com o tempo, vamos ficar invisíveis”, afirma Ana Scott, mãe de Thaís. “Não podemos permitir que esqueçam tudo.” Por ora, os parentes se concentram na identificação dos corpos – e mesmo um procedimento desses é coberto pela desconfiança. O gerente comercial Eurípedes Conceição Júnior, cuja namorada, a jornalista Katia Escobar, estava no vôo 3054, vai direto ao ponto. “A gente acredita que houve favorecimento na identificação dos corpos”, afirma Eurípedes. Katia era assessora do Sindicato dos Servidores Públicos Aposentados do Rio Grande do Sul, que perdeu dez associados na tragédia. “Só metade foi reconhecida.”
Até agora, um único episódio de indignação foi além do protesto, da desconfiança, da mobilização. Na reunião com os representantes das vítimas, o presidente da TAM, Marco Antonio Bologna, dois comandantes da companhia e um funcionário do Unibanco AIG (responsável pela indenização), as duas horas de discussões extrapolaram em ameaça física quando uma senhora exaltou-se e só não agrediu Bologna porque foi impedida por seguranças. No trauma do luto, a primeira reação é de raiva. A ela seguiu-se a indignação e, a partir de agora, os brasileiros se mobilizam pedindo o mínimo – que os aviões voem, pousem e transportem com segurança quem paga pelo serviço. É tão difícil acontecer isso?
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